Terça-feira, 19 de Agosto de 2008

Biografia - Isabel Feodorovna

 

 

A Grã-Duquesa Isabel Feodorovna da Rússia nasceu no dia 1 de Novembro de 1864 em Hesse-Darmstadt, Alemanha e era esposa do Grão-Duque Sergei Alexandrovich, quinto filho do Czar Alexandre II. Era conhecida por “Ella” pela família e amigos e era a irmã 8 anos mais velha da Czarina Alexandra Feodorovna, esposa do Czar Nicolau II. Isabel tornou-se famosa na sociedade russa pela sua beleza, charme e trabalhos de caridade entre os pobres.


Isabel (esquerda) com os pais e a irmã Vitória

 

Em Novembro de 1864, a Princesa Alice de Hesse escreveu uma carta à sua mãe, a rainha Vitória do Reino Unido, onde lhe contava que ela e o seu marido tinham decidido chamar a sua segunda filha, nascida no primeiro dia desse mês, de Isabel em honra da Santa mais amada e venerada no pequeno ducado de Darmstadt. “Esqueci-me de te dizer,” escreveu ela mais tarde numa outra carta, “em resposta à tua carta sobre o nome da Ella que ela deve ser chamada de Isabel. Apenas ‘entre-nous’ a tratamos por Ella.” Nos meses que se seguiram as suas cartas para a mãe enchiam-se de pormenores sobre a doçura da nova bebé, dos seus olhos azuis-escuros, do seu cabelo loiro, da sua alegria, a sua bondade e, ocasionalmente, das suas asneiras.

 

Isabel (esquerda) com as irmãs Vitória e Irene

 

Em Agosto de 1865, a Rainha Vitória foi até Darmstadt, em parte para assistir ao inicio da construção do novo Palácio da Princesa Alice e do seu marido e em parte para conhecer a sua nova neta. Sem se alarmar ou intimidar com o ar majestoso que rodeava a mulher baixa e forte, vestida com um longo vestido negro, a bebé sorriu-lhe e deixou que a sua avó lhe beijasse as bochechas sem qualquer protesto. “Ela é muito boa, a minha avó,” disse ela um pouco mais tarde e a Princesa Alice ficou, sem dúvida, aliviada, uma vez que a sua segunda filha tinha as suas próprias ideias e tinha-se revoltado com a sua outra avó, a Princesa Charles de Hesse lhe tinha tentado tocar. “É muito cansativo,” disse a Princesa Alice sobre o facto de a sua adorável filha não se conseguir comportar com pessoas desconhecidas.

 

Mas quando no Verão de 1865 a sua mãe a levou a visitar Heilligenberg e a sua tia-avó Maria Feodorovna (esposa do Czar Alexandre II)pegou nela ao colo, a pequena criança ficou encantada e colocou os seus braços à volta do seu pescoço, colando a sua cara aquela que era a fria Czarina da Rússia e que encontrou na sua adorável sobrinha-neta um refúgio para os seus dias de solidão no Palácio de Alexandre. Foi durante esta visita que Isabel brincou pela primeira vez com aquele que seria o seu futuro marido, o Grão-Duque Sergei Alexandrovich.

 

Isabel durante a infância

 

Apesar de descender de uma das mais antigas e mais poderosas famílias nobres da Alemanha, Isabel e a sua família tinham uma vida bastante modesta quando comparada com os padrões reais. As crianças varriam o chão e arrumavam os seus próprios quartos enquanto a sua mãe confeccionava as suas roupas e as dos filhos. Durante a Guerra Austro-Prussiana, era frequente a Princesa Alice levar Isabel consigo quando visitava soldados feridos num hospital próximo. No meio deste ambiente relativamente feliz e seguro, Isabel cresceu rodeada de hábitos domésticos ingleses e o Inglês tornou-se na sua língua principal, assim como a dos seus irmãos. As crianças falavam Inglês com a mãe e Alemão com o pai.

 

Ella (sentada com a irmã Mae nos braços) com os seus irmãos Irene, Ernesto, Alice (Alexandra da Rússia) e Vitória

 

No Outono de 1878, quando Isabel tinha 14 anos, a Difteria abalou a casa Hesse matando a sua irmã mais nova, Maria (conhecida na família por Mae) no dia 16 de Novembro desse ano. Isabel foi a única dos irmãos que não apanhou a doença e foi enviada para a casa dos avós paternos para não ser afectada. Enquanto lá estava, no dia 14 de Dezembro, a sua mãe sucumbiu à doença depois de cuidar de todos os filhos durante essas semanas. Quando Isabel foi autorizada a regressar à sua casa, descreveu a reunião como “terrivelmente triste” e disse que tudo parecia “um pesadelo horrível”.

 

Isabel (em pé na direita) com as irmãs puco depois da morte da mãe

 

Durante a sua juventude, Isabel era sedutora e tinha uma personalidade muito aberta. Muitos historiadores consideram-na uma das mulheres mais bonitas da Europa nesta altura. Foi durante esta época que ela chamou a atenção do seu primo mais velho, o futuro kaiser Guilherme II da Alemanha. Ele estudava na Universidade de Bonn e não era raro visitar os seus parentes de Hesse aos fins-de-semana. Durante estas visitas ele apaixonou-se por Isabel e escreveu-lhe numerosos poemas de amor que lhe enviava. Embora se sentisse elogiada pela atenção que recebia por parte do primo, Isabel não se sentia atraída por Guilherme e rejeitou-o educadamente. O futuro kaiser ficou frustrado e decidiu desistir da Universidade para voltar a Berlim.

 

Isabel durante a juventude

 

Além de Guilherme II, Isabel tinha muitos admiradores, entre os quais o Lord Charles Montagu, Segundo filho do 7º Duque de Manchester e Henry Wilson que se tornaria num famoso soldado.

 

Outro dos seus admiradores era o futuro Frederico II, Grão-Duque de Baden e primo de Guilherme. A Rainha Vitória descrevia-o como “tão bom e estável”, com “uma posição tão segura e feliz” e quando Isabel o rejeitou, a Rainha “arrependeu-se de o ter dito.” A avó de Frederico, a Imperatriz Augusta, ficou tão furiosa com a rejeição de Isabel que passou muito tempo sem a conseguir perdoar.

 

 

Ella em 1883

 

Eventualmente foi um Grão-Duque russo que conquistou o coração de Isabel. A tia-avó de Isabel, nascida em Hesse, era uma visita frequente no condado e, durante as suas visitas, era sempre acompanhada pelos seus filhos mais novos, Sergei e Paulo. Isabel conhecia os dois irmãos desde bebé, mas achava-os demasiado arrogantes e reservados. Sergei, particularmente, era um jovem calado, muito religioso e apaixonou-se por Isabel quando a viu pela primeira vez depois de muitos anos. Mais tarde ele pediu-lhe para casar com ele, mas, a principio, Isabel não se sentia apaixonada por ele.

 

A opinião da Princesa mudou quando Sergei perdeu os seus pais no mesmo ano. Maria Feodorovna de Hesse morreu de doença e Alexandre II foi morto num atentado à bomba em São Petersburgo quando se encontrava a caminho de uma reunião que tornaria a Rússia numa monarquia constitucional.

 

Ella com Sergei

 

O Grão-Duque encontrava-se em Roma quando o seu pai foi assassinado e, por isso, foi-lhe poupada a visão do seu corpo mutilado. Sergei admirava o seu pai e a sua morte fez com que se tornasse num selvagem anti-revolucionário que não escondia o ódio que sentia pelas pessoas que tinham ignorado os esforços de Alexandre II em liberalizar o país. A morte da sua mãe foi também difícil uma vez que ambos eram devotos um ao outro. Estes eventos mudaram-no e Isabel passou a vê-lo “com outros olhos”, uma vez que compreendia a dor pela qual ele passava depois de ter perdido a sua própria mãe. Outras parecenças como a arte e a religião aproximaram-nos cada vez mais. Há quem diga que ele gostava particularmente da sua personalidade que o fazia recordar a sua adorada mãe. Por isso, quando Sergei voltou a pedir a mão de Isabel em casamento no casamento da sua irmã com o Principe Louis de Battenberg, ela aceitou e ambos tiveram autorização do pai dela para se casarem. A Rainha Vitória não ficou particularmente encantada com a união.

 

Isabel e Sergei em 1892

 

O noivado da Princesa Isabel foi curto, uma vez que Sergei queria que o casamento se realizasse o mais rapidamente possivel e, apesar do pai dela não aceitar completamente a sua pressa, foi forçado a lidar com ela quando em Junho de 1884 chegou a São Petersburgo com Isabel e as suas duas irmãs mais novas Irene e Alice.

A Rússia, com a sua vastidão, a sua atmosfera estranha e inexplicável, surpreendeu as duas princesas mais velhas que, à excepção da Inglaterra, tinham visto muito pouco do mundo. As enormes praças e largas ruas de São Petersburgo, o Neva, maior do que qualquer rio inglês ou alemão, as cúpulas e espirais douradas das catedrais, a grandeza do Palácio de Inverno e a graciosidade da alta sociedade eram tão únicos e inesperados que elas se sentiram desorientadas e confusas, incapazes de se acostumarem ao ambiente estranho e pouco familiar que as rodeava.Elas sentiam-se intimidadas pelas multidões de criados e damas-de-companhia que as rodeavam sem descanço, pelos conselheiros da Corte que davam diferentes instruções e, acima de tudo, pelo irmão de Sergei, o Czar Alexanre III. O imperador era alto, tinha ombros largos, uma voz alta e mãos que conseguiam endireitar uma ferradura sem grande esforço. Apenas Alice que tinha apenas 12 anos na altura parecia não ter nenhuma apreensão. Ela não via nada de assustador, apenas “os corredores vastos e inspiradores do Palácio de Inverno com os seus quilómetros de chão dourado” e passou a maior parte do tempo a jogar às escondidas entre os pilares com o filho mais velho de Alexandre III que era, normalmente, tímido e indiferente com estranhos, mas achava aquela menina com os seus caracóis loiros uma companhia encantadora e com quem se sentia perfeitamente relaxado.

 

Isabel (2ª da direita) e as irmãs pouco antes do noivado

 

O Grão-Duque de Hesse não tinha permitido que a sua filha mudasse de religião antes do casamento, por isso houve uma cerimónia Luterana e uma Ortodoxa. Quando finalmente ambas as cerimónias acabaram e uma Isabel pálida teve de se despedir do seu pai e das irmãs, sentiu-se que ela estava aterrorizada com a perspectiva de ser forçada a viver uma nova vida num país desconhecido, rodeada de estranhos, novas ligações e com um marido que, no fundo, mal conhecia.

 

"Ella" no dia do casamento

 

Não existe nada que mostre se a nova Grã-Duquesa se sentia infeliz. Se sofria, fazia-o em silêncio, sem se queixar uma única vez. No entanto o sentimento geral na sociedade de São Petersburgo era de simpatia para com aquela jovem ingénua que se tinha casado com um homem conhecido pela sua rudeza e que se dizia esconder uma vida de imoralidade viciosa. Até a Rainha Maria da Roménia que, em criança, adorava o seu tio Sergei, confessou que ele sempre tinha sido um pouco assustador e que os seus olhos eram cinzentos e frios, os lábios finos e tinha sempre uma expressão dura.

Sergei era considerado um homem bonito, sempre vestido no seu uniforme verde-escuro que lhe dava um aspecto de respeito e conservadorismo. As pessoas que o conheciam diziam que sempre que estavam ao pé dele sentiam sempre que, por detrás da sua expressão controlada, havia uma camada secreta de raiva e frustração.Ele adorava a sua mulher, venerava a sua beleza e cobria-a de presentes como as mais caras jóias e peles, mas era frequente ele censurar o comportamento dela em público se ela se esquecesse das suas instruções ou cometesse o que ele considerava ser uma falta nas regras de etiqueta.

 

Sergei e Ella

 

Ninguém que via a Grã-Duquesa Isabel naqueles dias se esquecia dela. “Ela era a criatura mais bela de Deus que eu alguma vez vi”, escreveu um escritor contemporâneo. No entanto, embora se tivessem deixado levar pela sua beleza e apesar de ela ser jovem, alegre e uma pessoa que gostava de desfilar as jóias e roupas que o seu marido lhe oferecia, nunca houve nenhum escândalo ligado ao seu nome.

 

Ella em 1889

 

A Grã-Duquesa Isabel converteu-se à Igreja Ortodoxa apenas dois anos depois do casamento, muito contra a vontade do seu pai. Quando o Grão-Duque de Hesse soube que o Czarevich Nicolau se tinha apaixonado pela sua filha mais nova, a Princesa Alice, ele recusou-se a permitir que outra filha sua abdicasse da sua fé luterana. A Rainha Vitória também não aprovava estas mudanças de religião e não gostava particularmente da ideia de ver a sua neta favorita noiva do herdeiro ao trono russo. Ela tinha-o achado charmoso, simples e natural quando ele visitara Windsor, mas ao mesmo tempo tinha ficado com a sensação de que ele tinha falta de estabilidade e não conseguia tomar decisões por si mesmo. O Imperador e a Imperatriz partilhavam a sua apreenção, mas por razões completamente diferentes, A Princesa Alice não tinha ficado muito bem vista quando visitara São Petersburgo. Alexandre III achou-a uma alemã típica e Maria Feodorovna ficou incomodada com a sua apatia, além disso ela queria ver o seu filho casado com a filha do conde de Paris e não via como aquela pequena Princesa de Hesse com um feitio tímido e quase hostil poderia ser uma boa esposa.

Isabel com o seu sobrinho Nicolau durante uma peça de teatro

 

Tal como o seu avô, Alexandre II, o Czarevich estava determinado a conseguir aquilo que queria. “O meu sonho é casar-me com a Alice de Hesse”, escreveu ele no seu diário no dia 21 de Dezembro de 1889.

 

Isabel teve uma grande responsabilidade para com a relação do seu sobrinho com a sua irmã. Foi ela que incentivou o amor entre ambos e convenceu a Rainha Vitória (que queria casar Alice com o seu neto Alberto) a aceitar uma possível união entre a sua neta favorita e o Czarevich da Rússia.

 

 

Finalmente em Abril de 1894, o Imperador, que já começava a ceder, deu a sua permissão para que houvesse noivado e o seu filho correu até Coburg onde se realizaria o casamento do irmão de Isabel e Alice, Ernesto, com a Princesa Vitória Melita, filha do duque de Edimburgo. Nicolau pediu Alice em casamento, mas como esposa do Czarevich e herdeiro ao trono, a Princesa sabia que teria de mudar de religião e, a principio, não conseguiu decidir-se se aceitaria o pedido ou não. “A pobrezinha chorou muito,” escreveu Nicolau no seu diário onde descreveu a conversa que teve com ela que se prolongou até à meia-noite. No dia 8 de Abril, no entanto, chegou “um dia lindo e inesquecível” quando o jovem casal foi até ao quarto da Rainha Vitória de mão dada para lhe comunicar que tinham chegado a um acordo. “Fiquei bastante surpreendida”, escreveu a Rainha Vitória no seu diário, “Pensava que, por muito que o Nicky quisesse ir em frente com isto, a Alice não se iria decidir.”

 

O casamento realizou-se em Novembro e Alexandra foi coroada Czarina juntamente com Nicolau que passou a ser o Czar de Todas as Rússias.

Isabel (direita) com a irmã Alexandra e o cunhado Nicolau

 

 

Em 1891, Isabel e Sergei que não tinham filhos practicamente adoptaram os seus sobrinhos Maria e Dmitri Pavlovich, filhos do irmão de Sergei, Paulo. A mãe das crianças tinha caído quando tentava saltar para um barco em andamento e estava grávida de Dmitri. O bebé nasceu prematuro e a mãe morreu poucas horas depois. O pai ficou em estado de choque com a morte da esposa e aceitou de bom grado a ajuda do irmão e da cunhada. Muitos não acreditavam que o bebé fosse sobreviver, mas Sergei ajudou-o, dando-lhe os banhos prescritos pelos médicos, cobrindo-o com mantas de algodão e enchendo o seu berço com garrafas de água quente para manter a temperatura do bebé regular. “Estou a gostar muito de tomar conta do Dmitri,” escreveu Sergei no seu diário. Mais tarde Dmitri seria um dos assassinos de Rasputine, juntamente com o Príncipe Felix Yussopov.

Nesse ano Sergei foi também nomeado Governador de Moscovo e a família mudou-se para a nova cidade.

 

Ella com Dmitri ainda criança

 

O Jubilo de Diamante da Rainha Vitória em 1897 reuniu novamente a grande família em Londres. Seria a última vez que muitos dos seus netos e bisnetos veriam a pequena e velha mulher que durante muitos anos tinha sido o centro pelo qual as suas vidas dependiam para todo o tipo de decisões. Todos os convidados trouxeram presentes que incluíram uma corrente de diamantes das suas filhas mais novas, um alfinete de diamante do Príncipe e da Princesa de Gales, um pendente de diamantes e safiras do Grão-Duque Sergei e da Grã-Duquesa Isabel entre outros. A Rainha gostou de ver a sua família e de ser recebida festivamente pelos seus súbditos quando desfilou numa carruagem pelas ruas de Londres, no entanto esteve muito cansada durante os banquetes e cerimónias que se seguiram e começou a sentir-se ansiosa quando não reconheceu algumas das caras dos netos e bisnetos que falavam com ela. A rainha estava também preocupada com os problemas que afectavam a família na altura. O casamento do Grão-Duque de Hesse, Ernesto, com a filha do Duque de Edimburgo não estava a resultar, o Kaiser Guilherme II parecia cada vez mais zangado com a família por se sentir excluído e, quando o Imperador e a Imperatriz da Rússia a tinham visitado em Balmoral no ano anterior com a sua filha, ela achou que a “querida e simples Alicky” estava muito mudada e temia que a sua nova posição a estivesse a tornar demasiado imperial, o que a magoou muito.

 

No dia 28 de Junho, o Grão-Duque Sergei e a esposa despediram-se da Rainha Vitória para regressarem à Rússia. A Grã-Duquesa Isabel não conseguiu evitar as lágrimas, uma vez que sabia que aquela seria uma das últimas vezes que veria a sua avó que tinha mantido a família junta durante muitos anos e tinha sido a sua mãe substituta e, acima de tudo, uma grande amiga.

 

A desastrosa guerra Russo-Japonesa de 1904 trouxe uma tarefa à Grã-Duquesa que ela cumpriu de uma forma que deixaria orgulhosa a sua avó Vitória se ela fosse ainda viva. Como esposa do Governador de Moscovo, Isabel era líder das organizações da Cruz Vermelha da cidade. Ela enviou comboios-ambulância e equipamento para os soldados enquanto organizava salas de trabalho no Palácio do Kremlin e estava lá todos os dias a supervisor e dar motivação as centenas de mulheres de todos os estratos sociais que trabalhavam lá a empacotar material bélico, medicamentos, comida e roupa para os soldados na frente de combate. Vestia-se sempre de forma simples de azul ou cinzento, estava sempre lá de boa-vontade, tinha sempre um sorriso nos lábios ou um elogio para quem trabalhava, nunca perdia a paciência mesmo quando se cometiam erros e estava sempre pronta para executar os trabalhos mais difíceis.

 

Ella durante a Guerra Russo-Japonesa

 

No dia 4 de Fevereiro de 1905 quando Isabel estava a caminho dos seus quartos privados no palácio onde vivia com o marido e os sobrinhos, ouviu uma explosão que partiu todos os vidros da sua casa. Depois de muitos anos ela sabia que aquilo que temia (e o seu marido esperava) tinha acontecido. Durante muitos anos Sergei tinha-a proibido de andar na mesma carruagem dele e justificava-o dizendo que sabia do ódio que os habitantes de Moscovo sentiam por ele.

 

Sem esperar por alguém para perguntar o que tinha acontecido ou sequer vestir um casaco, Isabel desceu as escadas a correr até chegar ao dia frio de Inverno e seguiu um rasto de fumo e cheiro a pólvora que a levaram até à carruagem despedaçada do seu marido da qual apenas restavam os corpos mutilados dos cavalos. Quando chegou os guardas apressavam-se a cobrir o que restava do corpo do marido com os seus casacos.

 

Começaram a cair-lhe lágrimas e ela ajoelhou-se junto da mancha de sangue na neve, com a multidão a começar a reunir-se à sua volta, olhando horrorizada o macabro espectáculo enquanto a polícia e os soldados procuravam o assassino por entre as pessoas que se encontravam perto do palácio. Algumas horas antes ele tinha saído de casa com uma expressão preocupada, mas a assegurar-lhe que não havia nada com que se preocupar. Embora não tivessem um casamento perfeito, ele era o seu marido que sempre a tinha ajudado a adaptar-se à vida na Rússia e a tratava bem. Ele estava consciente do perigo que corria, mas mesmo assim nunca abandonou as suas responsabilidades e deu o seu melhor no cargo que ocupava. Contudo a sua austeridade quase fanática e a sua crueldade vingativa em certas ocasiões tinham feito com que ganhasse muitos inimigos. Ele era um anti-revolucionário e um autocrata quase tirano, mas ela estava casada com ele há vinte anos e era das únicas que conhecia toda a sua personalidade.

 

Quadro de Isabel

 

Nessa tarde, apesar da sua dor pessoal, Isabel visitou o cocheiro da carruagem do marido que estava gravemente ferido. Ele olhou-a nos olhos e perguntou, “Como está o seu marido?” Muito gentilmente a cara dela recompôs-se e respondeu, “Foi ele que me enviou para o ver” e ficou sentada na cama dele até o cocheiro morrer. Ela implorou a Nicolau para que não matasse o assassino, mas a sua petição foi recusada e ela foi visitar o homem à prisão. Ela tratou-a com desprezo e mantinha-se teimosamente cínico. Não se mostrou arrependido pelo que tinha feito e orgulhava-se da sua acção dizendo que tinha destruído um homem que era um inimigo do povo.

 

A partir desse dia, Isabel nunca mais comeu carne nem peixe. Quando chegou a casa dividiu as jóias que o seu marido lhe tinha oferecido em três e deu algumas aos seus sobrinhos Maria e Dmitri Pavlovich, devolveu as jóias da coroa e vendeu o resto. O dinheiro que ganhou das jóias foi para a caridade e para o Convento de Maria e Marta em Moscovo que passou a visitar com muita frequência, sempre de luto.

 

 

A alta sociedade de São Petersburgo nunca mais a voltou a ver. Só muito raramente Isabel visitava a irmã e a família em Czarskoe Selo e, em 1910, decidiu juntar-se definitivamente à Irmandade de Marta e Maria, doando todas as roupas e pedaços de joalharia que ainda lhe restavam. Não ficou nada, nem sequer com a aliança de casamento. “Este véu,” disse o Bispo Triphonius quando ela entrou no Convento, “vai-te esconder do mundo, e o mundo vai estar escondido de ti, mas vai ser uma testemunha dos teus bons trabalhos que irão brilhar perante Deus e glorificar o Senhor.” A sua nova vida era passada nos quartos pequenos do Convento, apenas mobilados com cadeiras brancas. Ela dormia numa cama de madeira sem colchão e com uma almofada dura. Queria sempre as tarefas mais difíceis, chegando a cuidar de 15 doentes na ala hospitalar sozinha e raramente dormia mais de três horas. Quando um paciente morria, ela passava a noite inteira junto dele (de acordo com a fé Ortodoxa) a rezar intermitentemente sobre o corpo morto.

 

Quando ela se tornou freira, a sua sobrinha Maria Pavlovna casou-se e o sobrinho Dmitri passou a viver com o Czar e a sua família.

 

Isabel como freira

 

Apesar de tudo, ela nunca se tornou rígida, severa ou deprimida e até manteve algum do seu divertimento que a tinha tornado encantadora quando jovem. Uma vez quando a sua irmã, a Princesa Vitória, estava no convento de visita com a sua segunda filha, a Princesa Louise, a porta do quarto delas abriu-se de manhã cedo e uma pequena cabeça espreitou a rir-se e a dizer “Olá”. Abismada, Vitória pensou tratar-se de um rapaz mal-educado que tinha conseguido entrar no convento e estava a invadir o seu quarto, mas depressa percebeu aliviada que se tratava da sua irmã mais nova, sem o seu véu e com o cabelo curto.

Depois de entrar no convento, Isabel apenas visitou São Petersburgo em duas ocasiões: quando se celebraram os 300 anos de poder dos Romanov em 1913 e quando rebentou a Primeira Guerra Mundial em 1914 onde ajudou a sua irmã com os planos de ajuda a soldados feridos.

 

"Ella" com a família imperial

Durante muitos anos, as instituições apoiadas por Isabel ajudaram os pobres e os órfãos de Moscovo. Ela e outras freiras da sua irmandade trabalhavam com os pobres todos os dias e foram responsáveis pela abertura de discussão sobre a possibilidade de permitir o acesso de mulheres a posições de maior importância dentro da igreja. A Igreja Ortodoxa recusou esta ideia, mas abençoou e encorajou os esforços de Isabel para com os pobres.

 

Em 1917 rebentou a revolução e, as ligações de Isabel à família imperial causaram-lhe muitos problemas.

 

 

 

Na Primavera de 1918, Lenine ordenou à Cheka que prendesse Isabel. Mais tarde ela seria exilada, primeiro em Perm e depois em Ekaterinburgo onde também se encontrava a sua irmã Alexandra e a sua família, mas nenhuma das duas sabia da presença da outra na cidade. Mais tarde ela iria juntar-se a outros membros da família Romanov como o Grão-Duque Sergei Mikhailovich, o Príncipe João Constantinovich, o Grão-Duque Constantino Constantinovich, o Grão-Duque Igor Constantinovich e Vladimir Pavlovich Paley. Com os membros da família vieram o secretário de Sergei, Feodor Remez e Varvara Yakovlena, uma freira da irmandade de Isabel. Todos eles foram levados para Alapaevsk no dia 20 de Maio de 1918 onde foram presos na antiga Escola Napolnaya nos arredores da cidade.

 

 Isabel com a irmã Vitória em 1916

 

Ao meio-dia do dia 17 de Julho, o Oficial da Checa, Petr Startsev e alguns trabalhadores bolcheviques chegaram à escola. Tiraram aos prisioneiros todo o dinheiro e valores que tinham e anunciaram-lhes que seriam transferidos nessa mesma noite para uma fábrica em Siniachikhensky. Os guardas do Exercito Vermelho receberam ordens para abandonar o local e foram substituídos por homens da Checa. Nessa noite os prisioneiros foram acordados e levados em carros numa estrada para Siniachikha. A cerca de 18 quilómetros de Alapaevsk havia uma mina abandonada com 20 metros de profundidade. Foi aqui que pararam. Os homens da Checa espancaram todos os prisioneiros antes de os atirar para a mina. Ainda antes de ser atirado, o Grão-Duque Sergei Mikhailovich foi morto a tiro por contestar e tentar espancar os guardas. Isabel foi a primeira a ser atirada. Apesar da profundidade apenas Feodor Remez morreu imediatamente.

 

De acordo com o testemunho de um dos assassinos, Isabel e os outros prisioneiros sobreviveram à queda na mina, o que levou o comandante a atirar as granadas. Depois das explosões, ele disse ter ouvido Isabel e os outros cantarem um hino russo do fundo da mina. Enervado, o comandante atirou uma nova rajada de granadas, mas continuou a ouvir-se os prisioneiros cantar. Finalmente foi atirada uma grande quantidade de arbustos para tapar a mina e o comandante deixou um guarda a vigiar o local antes de partir.

 

 

Na manhã de 18 de Julho de 1918, o chefe da Checa de Alapaevsk trocou uma série de telegramas com o chefe do Soviete Regional de Ekaterinburgo que tinha estado envolvido no massacre da família imperial. Estes telegramas tinham sido planeados com antecedência e diziam que a escola tinha sido atacada por um “gang desconhecido”. Pouco tempo depois Alapaevsk caiu nas mãos do Exército Branco.

 

No dia 8 de Outubro de 1918, os Brancos descobriram os restos mortais de Isabel e dos seus companheiros dentro da mina onde tinham sido assassinados. Isabel tinha morrido devido a ferimentos resultantes da sua queda de vinte metros, mas tinha ainda encontrado forças para fazer uma ligadura na cabeça do Príncipe Ioann. Os seus restos mortais foram retirados da mina e levados para Jerusalém onde estariam longe das mãos dos bolcheviques. Até hoje continuam enterrados na Igreja de Maria Madalena.

 

 

Isabel foi canonizada pela Igreja Ortodoxa For a da Rússia em 1981 e pela Igreja Ortodoxa Russa em 1992 como Nova Mártir Isabel. Os principais templos que lhe são dedicados são o Convento de Marfo-Mariinsky que ela fundou em Moscovo e o Convento de Santa Maria Madalena no Monte das Oliveiras, que ela e o marido ajudaram a construir. Era é uma das mártires do século XX que está representada numa das estátuas acima da Grande Porta Oeste na Abadia de Westminster em Londres, Inglaterra.

Outra estátua de Isabel foi construída após a queda do Comunismo no jardim do seu convento em Moscovo. Na inscrição pode ler-se “À Grã-Duquesa Isabel Feodorovna: Com arrependimento.”

 

Estátua de Isabel no Convento de Maria e Marta em Moscovo

 

Isabel Feodorovna foi assassinada por bolcheviques no dia 17 de Julho de 1918 quando tinha 54 anos


publicado por tuga9890 às 14:54
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Sábado, 21 de Junho de 2008

Nicolau II - A biografia (1ª parte)

Nicolau Alexandrovich Romanov nasceu a 18 de Maio de 1868 e foi o último czar da Rússia, rei da Polónia e Grão-Duque da Finlândia. O seu título oficial era Nicolau II, Imperador e Autocrata de Todas as Rússias e, hoje em dia, é um dos santos da Igreja Ortodoxa.

 

Nicolau II

 

Nicolau II governou desde 1894 até à sua abdicação em 1917. Provou ser incapaz de governar um país em tumulto político e de comandar o seu exército durante a Primeira Guerra Mundial. O seu reinado terminou com a Revolução Russa de 1917 durante a qual ele e a sua família foram presos, primeiro no Palácio de Alexandre em Czarskoe Selo, depois na mansão do Governador em Tobolsk na Sibéra e, finalmente, na casa Ipatiev em Ekaterinburgo onde a família acabaria por ser executada pelos bolcheviques na noite de 16 para 17 de Julho de 1918. Durante o seu reinado, Nicolau recebeu o cognome de Nicolau, o Sangrento devido aos trágicos acontecimentos durante a sua coroação, ao episódio do Domingo Sangrento e a subsequente repressão do seu governo ao movimento socialista. É também conhecido por ocupar o terceiro lugar na lista de pessoas mais ricas da História com uma fortuna  avaliada em 253.5 biliões de dólares .

 

 

 

Nicolau nasceu em Czarskoye Selo, o primeiro filho do Imperador Alexandre III e da sua esposa Maria Feodorovna, Princesa Dagmar da Dinamarca. Os seus avós paternos eram Alexandre II da Rússia e a sua primeira esposa Maria Alexandrovna, Princesa de Hesse-Darmstadt. Os seus avós maternos eram Cristiano IX da Dinamarca e Louise de Hesse-Kassel.

 

Nicolau II aos 3 anos de idade

 

Desde sempre uma criança sensível, Nicolau sentia receio da força e estatura do seu pai, Alexandre III, apesar de o adorar e falar  dele com saudade em cartas e diários depois da sua morte. Apesar de tudo era mais próximo da sua mãe. Nicolau tinha três irmãos: Alexandre (1869-1870), Jorge (1871-1899) e Miguel (1878-1918) e duas irmãs: Xenia (1875-1960) e Olga (1882-1960).

 


Nicolau com a  mãe em 1870

 

Nicolau tornou-se czarevich inesperadamente no dia 1 de Março de 1881 quando o seu avô foi assassinado num atentado bombista em São Petersburgo, sendo sucedido por Alexandre III. Nicolau tinha 12 anos e entrou na sala do Palácio de Inverno onde o seu  avô pálido estava deitado à espera da morte e sentou-se na ponta da cama a observá-lo por ordem do pai. A sua mãe, que tinha estado a patinar no gelo, chegou ainda com os patins calçados, movimentando-se com dificuldade. O seu pai ficou paralisado do lado de fora da janela, a tremer nervosamente até o médico anunciar a morte do czar libertador.

 

Nicolau durante a infância

 

Muito se tem escrito sobre o luxo e opulência da vida dos Romanov. De facto, a corte era deslumbrante, mas o esplendor não chegava aos aposentos das crianças. No Palácio de Inverno, em Czarskoe Selo, Gatchina e Peterhof, foi possível visitar esta área até 1922 e constatou-se que as crianças dormiam em camas amovíveis com almofadas duras e colchões finos. O chão era coberto com uma carpete modesta e não existiam cadeiras nem sofás, sendo que a única mobília da divisão eram alguns bancos, pequenas mesas e estantes onde se guardavam livros e brinquedos.


O único pormenor rico era apenas visível numa das paredes onde estava pendurada uma imagem da Virgem de Kasam rodeada de pérolas e pedras preciosas. A comida era muito simples e, desde os dias de Maria Alexandrovna, esposa de Alexandre II, os costumes ingleses foram introduzidos: papas de aveia para o pequeno-almoço, banhos frios e muito ar fresco. Ao almoço, Nicolau e os irmãos juntavam-se aos seus pais na refeição onde havia mais fartura, no entanto, as crianças eram as últimas a ser servidas depois de todos os convidados presentes e ainda tinham de sair da mesa assim que o seu pai se levantasse, o que acabava por fazer com que ficassem com fome.

 

Nicolau (direita) com o irmão Jorge

 

Um dia, durante uma das longas celebrações pascais que a família tinha de frequentar, um Nicolau esfomeado aproveitou um crucifixo que trazia ao pescoço desde o nascimento que tinha uma amostra de cera dentro. “O Nicky estava com tanta fome que abriu a cruz e comeu tudo o que estava lá dentro, incluindo a relíquia que estava escondida na cera”, recordou a sua irmã Olga.

 

Nicolau (no centro) com os primos ingleses

 

Nicolau passou a maior parte da sua infância no Palácio de Gatchina, cerca de 64 quilómetros a oeste de São Petersburgo, perto de Czarskoe Selo. Gatchina tinha 900 quartos e era o palácio preferido de Alexandre III que possuía ainda palácios em Peterhof, Czarskoe Selo, Anitchkov, Moscovo e em Livadia, na Crimeia.


O czarevitch foi educado por tutores. Havia tutores de línguas, de geografia e ainda um tutor de dança que usava luvas brancas e exigia que uma grande jarra de flores estivesse sempre presente quando ele tocava piano. De todos os tutores, o mais importante foi Constantino Petrovich Pobesdonostsev, um filósofo.

 

Nicolau durante a sua juventude

 

Em vários aspectos, a educação de Nicolau foi excelente. Ele tinha uma memória extraordinária, o que o tornava um excelente aluno em História, falava Francês, Alemão, e o seu Inglês era tão bom que poderia ter enganado qualquer professor de Oxford e fazê-lo acreditar que era inglês. Era bom cavaleiro, dançarino e excelente com armas. Desde cedo foi ensinado a manter um diário e, ao estilo de infindáveis príncipes e cavalheiros da época, registava fielmente, dia após dia, o estado do tempo, o número de pássaros que tinha morto e os nomes daqueles que o acompanhavam em passeios e jantares.

 

 

Em Maio de 1890, alguns dias antes do seu 22º aniversário, Nicolau escreveu no seu diário: “Hoje terminei definitivamente a minha educação.” Na maioria do tempo, não era pedido a Nicolau que fizesse alguma coisa. A função essencial do czarevich, assim que terminava a sua educação e atingia a idade adulta, era esperar o mais discretamente possível a sua vez de subir ao trono. Em 1890, Alexandre III tinha apenas 45 anos e esperava-se que continuasse a ocupar o seu lugar por mais 20 ou 30  por isso, apesar de duvidar da capacidade do filho em assumir as suas responsabilidades, não fez grande coisa para o preparar. Nicolau aceitou alegremente o papel de “playboy” para o qual tinha sido designado. Por vezes o seu pai obrigava-o a assistir a reuniões do Concelho Imperial, mas os seus olhos estavam presos no relógio e, na primeira oportunidade, fugia.

 

Nicolau (2º da esquerda) com alguns membros da família


Tratado de “Nicky” pela sua família e amigos mais próximos, o czarevich apaixonou-se pela Princesa Alix de Hesse-Darmstadt, neta da Rainha Vitória de Inglaterra, em 1884 durante o casamento do tio de Nicolau, Sergei Alexandrovich, com a irmã de Alix., Isabel Ele tinha 16 anos e ela apenas 12. Os dois voltariam a encontrar-se em 1889, quando ele tinha 21 e ela 17. Ele levou-a a patinar no gelo e ambos encontraram-se em vários bailes e jantares. Depois de ela deixar São Petersburgo, ele afirmou que, se Alix o rejeitasse, ele nunca se casaria. Os seus pais, no entanto, não aprovavam este romance, com esperança de cimentar a nova aliança entre a Rússia e a França casando o seu filho com a Princesa Hélène, filha do Conde Filipe da Casa de Orléans.

 


Nicolau e Alexandra em 1894

 

Como czarevich, Nicolau viajou bastante. Durante uma viagem ao Império do Japão, uma tentativa de assassinato falhada com um sabre, deixou-lhe uma cicatriz na testa. A reacção rápida do seu primo, o Príncipe Jorge da Grécia e da Dinamarca, que evitou um segundo golpe com a sua bengala, salvou-lhe a vida. O motivo para esta tentativa de matar o herdeiro ao trono russo, foi o facto de o homem se sentir ofendido por um estrangeiro estar a visitar um templo sagrado que nunca antes tinha aceitado a entrada de alguém de outra religião. O incidente teve um efeito histórico infeliz em Nicolau que passou a odiar o Japão e acabaria por entrar em guerra com o país entre 1904-1905.

 

 

Nicolau II  passeia  pelo  Japão

 

Nicolau ficou noivo de Alix de Hesse em Abril de 1894. A principio teve alguns problemas para a convencer a tornar-se sua noive, uma vez que uma Imperatriz da Rússia tinha de se converter à Igreja Ortodoxa Russa, e Alix era luterana. Eventualmente, no entanto, a paixão de Alix por Nicolau venceu e o noivado tornou-se oficial a 8 de Abril de 1894. Alix converteu-se em Novembro desse mesmo ano e mudou de nome para Alexandra Fedorovna.

 

Ao longo de 1894, a saúde de Alexandre III foi-se deteriorando inesperadamente. Esperando viver mais 20 ou 30 anos, Alexandre não deu a educação política que pretendia ao seu filho, o que resultou no fraco interesse de Nicolau pelos assuntos imperiais. Apesar de ser uma criança educada e encantadora, sempre mostrou falta de interesse ou curiosidade nas lições dos tutores. Mesmo quando Alexandre tentou introduzir o filho nos assuntos do Estado, Nicolau perdeu o interesse depois de passar vinte minutos nas sessões do conselho e saiu para ir ter com os seus amigos aos cafés. Alexandre morreu aos 49 anos em 1894 devido a uma doença de rins. Nicolau sentiu-se tão pouco preparado para os seus deveres que terá perguntado ao seu primo o que iria acontecer consigo e com a Rússia agora que chegara a sua vez de governar. Apesar de tudo, decidiu manter a política conservadora do seu pai.

 

A coroação de Nicolau II e Alexandra Fyodorovna em 1896

O casamento de Nicolau e Alexandra, planeado para a Primavera seguinte, foi antecipado por insistência de Nicolau. Sufocado pelo peso do seu novo cargo, o czar não tinha intenções de permitir que a única pessoa que lhe dava confiança o abandonasse. O casamento foi celebrado no dia 26 de Novembro de 1894. Alexandra usou o vestido tradicional das noivas Romanov e Nicolau levou o seu uniforme. Poucos minutos antes da 1 da tarde, os dois tornaram-se marido e mulher numa união que se manteria forte até à morte de ambos.

Alexandra no seu casamento

 

Apesar de uma visita ao Reino Unido antes da sua coroação onde observou a Casa dos Comuns em debate e pareceu bastante impressionado pela forma como funcionava a Democracia, Nicolau virou as costas a qualquer ideia de partilhar o seu poder com algum órgão do género na Rússia. Pouco depois de ascender ao trono, um grupo de camponeses e trabalhadores de vários pontos do país foram até ao Palácio de Inverno pedir algumas reformas constitucionais. Apesar de os seus pedidos lhe terem sido entregues por escrito, Nicolau limitou-se a juntá-los aos muitos papéis da secretária, furioso pela sua ousadia e ignorando os conselhos da família para lhes prestar a atenção devida: “… chegou-me aos ouvidos que durante os últimos meses, se têm ouvido vozes daqueles que imergiram em sonhos sem sentido de que os zemstvos (concelhos do povo) seriam chamados para participar na governação do país. Quero que todos saibam que eu vou dedicar toda a minha força para manter, para o bem da nação, o principio de autocracia tão fortemente como o meu pai o fez.” Estas palavras deixaram perplexos todos quantos as ouviram e resultaram na destruição da popularidade do novo czar e da esperança de uma mudança pacífica na Rússia.

Apesar destas palavras fortes, Nicolau era tímido na presença de membros mais velhos da sua família. O seu cunhado, o Grão-Duque Alexandre Mikhailovich, escreveu mais tarde que, “Nicolau II passou os seus primeiros 10 anos de reinado sentado atrás de uma grande secretária no Palácio e a ouvir com pouca atenção o discurso bem ensaiado dos seus tios abusivos. Ele atreveu-se a ficar sozinho com eles… Eles queriam sempre alguma coisa.”

 


Nicolau, a sua esposa Alexandra, e alguns dos seus tios e primos


O choque entre a Rússia e o Japão foi quase inevitável no inicio do século XX. A Rússia tinha-se expandido para o Oriente e as suas pretensões territoriais colidiam com as pretensões japonesas na China. A Guerra começou em 1904 com um ataque surpresa à frota russa no Porto Artur, que incapacitou a marinha russa no Oriente. A frota báltica tentou fazer a travessia marítima para ajudar na batalha, no entanto, depois de vários percalços no caminho, foi aniquilada pelos japoneses na batalha do estreito de Tsushima. Em terra, as tropas russas estavam desprovidas de mantimentos devido a uma avaria na linha férrea trans-siberiana. A guerra terminou com a derrota da Rússia após a queda do Porto Artur em 1905.

 


Ataque ao Porto Artur

 

A posição de Nicolau na Guerra foi algo que frustrou muitos. Pouco antes do ataque japonês ao Porto Artur, Nicolau manteve firmemente a sua crença de que não haveria guerra. Sentia que havia um poder divino a governar e proteger a Rússia e que impediria qualquer tipo de guerra com o Japão. Apesar das muitas derrotas, Nicolau continuou a acreditar numa vitória. Muitas pessoas viram a confiança e teimosia do czar como um sinal de indiferença, achando-o impenetrável. À media que a Rússia continuava a ser derrotada, as vozes pedindo paz começavam a aumentar. A própria mãe do czar, bem como o seu primo Guilherme II, pediram a Nicolau que abrisse negociações de paz, mas apesar de todos os esforços, este continuou a sua estratégia. Apenas quando a frota russa foi totalmente eliminada a 28 de Março, Nicolau decidiu dar inicio ao processo de paz.

 

Como resultado, o orgulho russo foi severamente afectado e a popularidade de Nicolau II sofreu mais um grave golpe com várias greves e manifestações que assolaram o país entre 1905 e 1906. Durante a época de tumulto, o tio do czar, o Grão-Duque Sergei, foi morto por uma bomba quando saía do Kremlin.

 


Grão-Duque Sergei Alexandrovich

 

No dia de Epifania, a 19 de Janeiro de 1905, decorreu a tradicional Bênção das Águas em frente do Palácio de Inverno. Como era hábito, foi construído um pódio para o czar, alguns membros da corte e do clérigo enquanto que outros membros da família real assistiam à cerimónia das janelas do palácio. A cerimónia começou com uma saudação de canhão que acabou por aterrar perto do czar e feriu um polícia. Mais tarde outras balas de canhão acabariam por ferir um Administrador e partir várias janelas do palácio (uma delas quase vitimou a mãe e a irmã de Nicolau, Olga que estavam a poucos metros de distância de uma das janelas).  Apesar de tudo, o Imperador manteve a mesma  postura desde o inicio da cerimónia. Quando finalmente chegou ao palácio disse à sua irmã Olga: “Eu sabia que alguém me estava a tentar matar e limitei-me a fazer o sinal da cruz. O que mais podia fazer?”. A Grã-Duquesa comentou mais tarde que, “era típico do Nicky. Ele não sabia o que significava ter medo. Por outro lado, parecia que ele sempre tinha aceitado que acabaria por perder a vida.”


No dia 21 de Janeiro de 1905, um padre chamado George Gapon informou o governo de uma marcha que se realizaria no dia seguinte e perguntou se o czar estaria presente para receber uma petição. Os ministros reuniram-se apressadamente para ponderar sobre o assunto. Nunca se pensou que o czar, que estava em Czarskoe Selo e não tinha sido informado de nenhuma marcha nem petição, iria realmente receber Gapon. A sugestão de que outro membro da família imperial deveria receber a petição foi também rejeitada. Por fim, informado de que tinha poucos meios para travar a marcha e prender Gapon, o novo ministro do interior e os seus colegas não pensaram em mais nada senão chamar tropas adicionais à cidade e esperar que nada se descontrolasse.

 

Domingo Sangrento

 

Nessa noite, Nicolau soube pela primeira vez por esse ministro o que iria acontecer no dia seguinte e escreveu no seu diário, “As tropas foram trazidas de fora da cidade para apoiar as locais. Até agora os trabalhadores têm-se mantido calmos.  Em estimativa são cerca de 120,000. A chefiar a sua união está uma espécie de padre socialista chamado Gapon. O Mirsky (ministro do interior) veio encontrar-se comigo esta noite para me apresentar o seu relatório sobre as medidas a ser tomadas.”

 

No dia seguinte aconteceria o trágico “Domingo Sangrento” onde milhares de manifestantes foram mortos pelas tropas do czar que guardavam o Palácio de Inverno.

 

Em Czarskoe Selo, Nicolau ficou chocado quando soube o que tinha acontecido e escreveu no seu diário, “Um dia doloroso. Desordens sérias aconteceram em São Petersburgo quando os trabalhadores tentaram entrar no Palácio de Inverno. As tropas foram forçadas a disparar em várias partes da cidade e há muitos feridos e mortos. Senhor, quão doloroso e triste isto é.

O “Domingo Sangrento” tornou-se num ponto de viragem na História Russa. Abalou irremediavelmente a antiga crença de que o povo e czar eram um só. Enquanto as balas faziam ricochete nos seus ícones, retratos e bandeiras de Nicolau II, as pessoas gritavam que o czar não as iria ajudar. Fora da Rússia, mo futuro Primeiro-Ministro trabalhista britânico, Ramsay MacDonald atacou o czar, chamando-o de “criatura coberta de sangue” e “assassino banal”.

 


Domingo Sangrento

 

A Grã Duquesa Olga Alexandrovna descreveu o que aconteceu nesse dia com o seu irmão, “O Nicky recebeu o relatório político alguns dias antes. Naquele Domingo ele telefonou à minha mãe e disse-lhe que ambas tínhamos de abandonar Gatchina depressa. Ele e a Alicky (Alexandra) foram para Czarskoe Selo. Que me lembre o meu tio Vladimir e o meu tio Nicolau eram os únicos membros da família que restavam em São Petersburgo, mas talvez houvesse outros. Na altura senti que todas as medidas tomadas estavam tremendamente erradas. Os ministros do Nicky e o Chefe da Polícia fizeram tudo à maneira deles. A minha mãe e eu queríamos ficar em São Petersburgo e enfrentar a multidão. Tenho a certeza de que, pelos grotescos modos de alguns dos trabalhadores, a presença do Nicky teria acalmado os ânimos. Eles teriam entregue a sua petição e voltado para casa, mas aquele acontecimento quase Epifânio deixou todos os guardas em estado de pânico. Eles estavam sempre a dizer ao Nicky que ele não tinha o direito de correr tamanho risco, que o país merecia que ele saísse da capital, que mesmo com as melhores medidas de protecção haveria sempre perigo. A minha mãe e eu fizemos os possíveis para o persuadir de que os conselhos dos ministros estavam errados, mas o Nicky preferiu segui-los e foi o primeiro a arrepender-se quando soube as trágicas consequências.”

 

Sob pressão depois da tentativa da chamada Revolução Russa de 1905, Nicolau II concordou com a formação de uma espécie de parlamento, a Duma, que inicialmente se pensava ser apenas um órgão de aconselhamento. A irmã do czar escreveu: “Todos estavam em baixo em Czarskoe Selo. Eu não percebia nada de política, apenas senti que tudo estava a correr mal com o país e com todos nós. A constituição de Outubro não parecia satisfazer ninguém. Fui com a minha mãe à primeira Duma. Lembro-me do grande número de deputados que vieram dos camponeses e do operariado. Os camponeses pareciam zangados, mas os operários eram ainda piores: eles olhavam-nos como se nos odiassem. Lembro-me da agonia nos olhos da Alexandra.” O Ministro da Corte, o Conde Fredericks, comentou, “Os deputados dão a impressão de um grupo de criminosos que estão apenas à espera do sinal para se atirarem aos ministros e cortar-lhes a garganta. Eu nunca mais me vou juntar a estas pessoas.” A mãe do czar reparou no “ódio incompreensível”.

 

Nicolau II dirige-se à Duma

No manifesto de Outubro, o czar anunciou introduzir liberdades cívicas, providenciar grande participação nas discussões da Duma e imbui-la de poderes legislativos. Contudo, determinado a preservar a “autocracia” mesmo durante um contexto de reforma, ele restringiu a autoridade da Duma em muitos sentidos.


A relação de Nicolau com a Duma não era boa. A primeira Duma entrou quase imediatamente em confronto com ele, exigindo sufrágio universal, reformas laborais radicais, a libertação de todos os prisioneiros políticos e o despedimento dos ministros nomeados pelo czar por ministros escolhidos pela própria Duma. Apesar de inicialmente Nicolau ter uma boa relação com o seu Primeiro-Ministro, Sergei Witte, Alexandra não confiava nele (devido ao facto de este ter ordenado uma investigação a Rasputin), e, à medida que a situação política se deteriorava, Nicolau decidiu dissolver a Duma.


A Duma era populada por radicais, muitos dos quais queriam mudar profundamente a legislação que abolia o direito a propriedade privada entre outras coisas. Witte, incapaz de resolver os aparentemente irremediáveis problemas de conduzir uma reforma na Rússia e na monarquia, escreveu ao czar no dia 14 de Abril de 1906, demitindo-se do seu posto (outros dizem que este foi forçado a demitir-se pelo Imperador).

 

Sergei Witte

 

Uma segunda Duma reuniu-se pela primeira vez em Fevereiro de 1907. Os partidos de esquerda, incluindo os Sociais Democratas e os Socialistas Revolucionários que tinham boicotado a primeira Dume, tinham ganho 200 lugares na segunda, mais de um terço de todos os participantes.  Novamente Nicolau esperou impacientemente para se livrar da Duma. Em duas cartas que escreveu à sua mãe, ele confessou o seu ressentimento, “Uma comitiva grotesca está a chegar da Inglaterra para se encontrar com os membros liberais da Duma. O tio Bertie informou-nos de que eles pediam desculpa, mas não podiam fazer nada para impedir a vinda deles. A sua famosa “liberdade”, claro. Quão zangados ficariam eles se nós enviássemos uma comitiva à Irlanda para lhes desejar sucesso na luta deles contra o governo?” Um pouco mais tarde, Nicolau escreveu, “Todos estariam felizes se tudo dito na Duma não saísse das suas paredes. No entanto cada palavra lá proferida aparece em todos os jornais no dia seguinte e estes são lidos avidamente por todos. Em muitos lugares a população está a agitar-se novamente. Eles começaram a falar sobre terra outra vez e estão à espera para ver o que a Duma vai dizer sobre esta questão. Estou a receber telegramas de todo o lado, a pedir-me que a dissolva, mas é demasiado cedo para isso. Temos de esperar que eles façam algo estúpido ou maléfico e depois – bam! E eles desaparecem!”


Depois da dissolução da segunda Duma em circunstâncias semelhantes, o novo Primeiro-Ministro, Pyotr Stolypin (que Witte descreveu como “reaccionário), mudou as leis eleitorais de forma a permitir que futuras Dumas fossem mais conservadoras e dominadas pelo partido conservador-liberal de Alexander Guchkov.


Stolypin, um brilhante político, tinha planos ambiciosos de reforma. Estes incluíam disponibilizar empréstimos para classes inferiores de modo a permitir que estes comprassem terra e, assim, criar uma classe camponesa leal à coroa.

 

Pyotr Stolypin

 

 

música: The Hours - "Love You More"

publicado por tuga9890 às 13:54
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